quarta-feira, 12 de julho de 2023

CULTO (I)

                                                                                                 Profa. Westh Ney Rodrigues Luz

 Os que experimentaram o encontro com Cristo e nasceram de novo – não da carne, mas do Espírito – de maneira natural se curvam e se prostram ao maior milagre que é mudança de mente (metanóia). Quando a mudança acontece não queremos que nada nos afaste do desejo de ser sermos submissos ao Criador que nos ama e provoca esse encontro. Não desejamos que nada nos afaste do nosso amor em ação à Deus e aos homens. A mudança que ocorre do encontro com o Eterno, com Cristo, o Redentor, se dá por intermédio do Santo Espírito que toca o mais profundo da nossa alma, nos inquieta e nos faz rejeitar o que não seja puro e nem santo. No encontro com o Eterno, percebemos que estamos diante da mais inexplicável, difícil, misteriosa e significativa experiência. Encontro com o Poderoso, Onipotente, Onisciente, Digno, Justo e Senhor. Encontro com a Água da vida, com o Salvador, o Redentor, o Amigo, o Mestre, o Rei Jesus. Encontro com o sábio Conselheiro, com o Ajudador, com o nosso Guia e Consolador – o Santo Espírito que nos orienta e anima, fazendo que em meio às lutas desta vida saibamos que não estamos órfãos.

Percebemos nessa experiência, que somos atraídos pelo amor de Deus e que nossa resposta depende dessa percepção, como cita o teólogo [1]Nikos Nissiotis, p.17: “O culto não é primordialmente iniciativa do ser humano, mas ato redentor de Deus em Cristo por meio do seu Espírito”. 

 Não estamos falando de culto nos templos. Estamos falando do desejo que a alma tem de se conectar com seu Criador, quando percebe seu amor, não está restrito a um local ou formato.

 

“O culto no templo é apenas um tipo de culto, não o único. Culto é para ser prestado em casa, na rua, no trabalho, onde não é possível vivenciar um cerimonial. A religião deve ajudar o crente em seu culto, não atrapalhá-lo. O templo deve concentrar os que cultuam, mas não ser tido como o único lugar para a adoração”. (prof. Pr. BELO AZEVEDO, 2019[2]


  
Culto é na realidade o encontro do homem com Deus! Culto coletivo é o encontro deste homem com Deus e com seu próximo. O que é culto para você?
 
Paul Hoon, Peter Brunner, George Florovsky, Evelyn Underhill e Nikos Nissiotis [3] falam do culto como auto revelação de Deus (revelação e resposta), como uma estrada de mão dupla, por que é a sua graça e seu amor que evocam a nossa entrega a Deus. Resumindo – qualquer que seja o culto, será sempre a resposta da criatura ao Eterno. E precisamos entender que Ele se doa e ainda nos instiga à uma resposta de forma natural. A revelação de Deus se dá por meio de Jesus Cristo e nós respondemos a ele também por meio de Jesus. E como respondemos? Com tudo que somos e fazemos, com emoções, orações, ações e palavras.

Pode ser que esteja acontecendo em alguns ajuntamentos dominicais algo que esteja possibilitando a não percepção da importância do culto. Coloco aqui algumas indagações para nos levar à uma reflexão:

 

Para quem é o culto? Quem vai receber adoração e louvor? Como vamos fazer para que todos que chegarem ao encontro dominical, percebam a importância do ajuntamento que deve ser “um ajuntamento solene”? Qual a importância e relevância de todos que participam no culto? Será que todos entendem os seus papéis?

Em muitas ocasiões, percebemos que alguns cultos têm se transformado em momentos de entretenimento, de uma alegria exacerbada, sem sentido e fabricada, à procura de uma catarse coletiva ou qualquer outra coisa, menos estar ajoelhado diante do Senhor, rasgando seus corações e almas diante de tão grande amor.

Penso que o que tem acontecido é o desvio na motivação que percebemos em muitos cultos, que equivocadamente, nos levam a desviar nosso olhar da majestade e do amor irresistível de Deus que nos atrai. Parece ser fruto, talvez, de um consumismo exagerado, uma agitação sem sentido, um modelo de vida descartável que se reflete na criação de um estilo de vida de muitos.

 

Sei que essas perguntas nos instigam a uma reflexão e não a faremos agora. Mas, pense e reflita. É assim que fazemos no Seminário do Sul. Estudamos culto à luz da Palavra de Deus e dos grandes pensadores – homens e mulheres – que têm nos seus estudos e explanações teológicas pensado sobre esse momento importante do grande ENCONTRO do homem com Deus na sua comunidade, no seu lar, no seu quarto, no seu coração.

 

Tenho meditado e me debruçado sobre esse assunto que move o meu coração e talvez você já tenha lido algo como o que estou escrevendo agora. Não é que eu seja repetitiva, é que entendo que não posso perder de vista o porquê de estarmos diante do Eterno cultuando.

 

Deus, nosso Pai eterno, nos atrai com seu amor e nós, pecadores, mortais e sujeitos a toda sorte de enganos temos o privilégio de sermos acolhidos na sua doce e santa presença.

Um privilégio, uma honra.

Seja Deus louvado eternamente!

..

Fortaleza. Ceará, 11/07/2023

Escrito para o site de música do Seminário do Sul/STBSB.



[1] WHITE, James, p. 17, 1997.

[3] WHITE, James, p. 16-18, 1997.

sexta-feira, 19 de agosto de 2022

ISIDORO LESSA DE PAULA (MG,1943)

Três relatos biográficos sobre o excelente músico e professor Isidoro.


 1. Biografia resumida:
Pianista, tradutor, compositor, hinólogo e Ministro de Música no Brasil e nos EUA. Formado em Letras, UFF, RJ; Música pelo CBM, Rio; Mestrado em Composição e piano em Louisville. Um dos primeiros Ministros de Música consagrados no país. Volta aos EUA, para estudar na área de Ministério da Música e Administração. Lá foi novamente graduado com  mestrado em Regência e o doutorado em Hinologia e Regência.  Tem contribuído com muitas traduções e entre elas o Hino 43 HCC de Pauline Mills; Moteto para quarteto e coro de Michael Haydn; Te Deum de Ralph Vaughan Williams; cantata Emanuel, Deus Conosco (vozes juvenis).
 
Foi professor e diretor do curso de música sacra do Seminário Batista de Niterói, prof. na Faculdade Batista de São Paulo, SP e Seminário Equatorial e no Seminário do Sul onde também foi coordenador interino do Curso de Música Sacra. Fez parte da Subcomissão de Textos do HCC (relator por dois anos). Sua tese de doutorado “Os primórdios da Hinódia das Igrejas Batistas Brasileiras” – suas fontes e desenvolvimento serviu como fonte básica para o livro Notas Históricas do HCC - Hinário para o culto cristão.
Biografia resumida (por Westh Ney Rodrigues Luz, para a Revista Louvor, nº 156.)

2. Biografia escrita por sua esposa Bárbara
 
Nascido em Manhumirim, Minas Gerais, perto do Pico da Bandeira, desde a adolescência ele morou em Niterói e tornou-se membro ativo da Primeira Igreja Batista de Niterói. Completou os estudos de música no Conservatório Brasileiro de Música aos 18 anos, e formou-se pelo Departamento de Letras da UFF em Português/Francês. Lecionou Português, Francês e Musica em escolas de Niterói e São Gonçalo. Foi presidente da União 3, envolvendo-se na liderança das atividades de adolescentes e jovens da igreja, e tocando piano nos cultos.

Em 1970 foi aos EUA para começar a se preparar para seu ministério de mais 35 anos. Em Louisville recebeu seu primeiro mestrado em Musica Sacra com concentração em Piano e Composição, onde conheceu sua esposa Bárbara que também cantava no coro da Igreja de Walnut Street, que o ajudou durante seu curso. Voltou para a Primeira Igreja Batista de Niterói em 1973 como um dos primeiros Ministros de Música consagrados no Brasil.

 Retornou aos USA em 1976 para continuar os estudos na área de Ministério da Música e Administração, recebendo outro mestrado em Regência e o doutorado em Hinologia /Regência. 
 
Continuou seu ministério no Brasil com a família em 1985, agora com os filhos Marcus, Mateus e Marisa, quando foi professor de música no Seminário Teológico Batista de Niterói, e diretor interino do Departamento de Música do STBSB/Seminário do Sul. 
 
No final de 1980 mudou-se para a Flórida perto dos pais da Bárbara que estavam precisando de ajuda e concluiu seu ministério de música depois 10 anos como MM na igreja batista de Tuskawilla, Winter Park. 
 
Serviu um semestre no seminário em Belém como regente coral e diretor interino do Departamento de Música do Seminário Equatorial. Ao voltar para a Flórida assumiu a posição de professor no Departamento de Música da Faculdade Rollins, em Winter Park, lecionando também na Escola da Comunidade da Rollins, aonde permanece até hoje como coordenador e professor de Teoria musical e Piano - continuando assim no ministério de preparar jovens para o uso da música, dom divino, em suas vidas. 
BJP, dez '18 (Bárbara J. de Paula, 2018)
 

3. Edith Mulholland, no Livro Notas históricas do HCC, escreveu a biografia de Isidoro no hino 43  -  Digno é o Cordeiro  de Pauline Mills.  Segue a biografia:
 
Isidoro é mineiro, nascido em 21 de agosto de 1943 e tem uma rica herança cristã. Seu avô materno, Alberto Vaz Lessa, convertido no ministério do inimitável Salomão Ginsburg (ver HCC 29), “foi pastor pioneiro, plantando igrejas batistas na região montanhosa do sudeste do Brasil”

Isidoro é o quarto de seis filhos de uma família batista, membros fundadores da Igreja Batista de Manhumirim, Minas Gerais. Sua mãe, Dahlia Lessa de Paula, crente dedicada. Seu pai, Sr. Theonillo Rodrigues de Paula, criado católico e devoto filho de Maria, converteu-se através das orações e testemunho persistente de sua esposa. Ele serviu como diácono em várias igrejas batistas, e orgulhou-se do filho que veio a ser um dos primeiros ministros de música de tempo integral no Brasil. A família mudou-se do interior de Minas Gerais para Niterói, aonde o jovem Isidoro logo se revelou como líder de música e juventude na igreja local e denominação. 

Isidoro sentiu a chamada de Deus para aprimorar e usar o dom da música como veículo de louvor a Deus, edificação do salvos e propagação do evangelho. Depois de se formar em piano no Conservatório Brasileiro de Música e de completar o curso de letras da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal Fluminense, Isidoro ganhou uma bolsa de estudos, através do incentivo de seu pastor, Dr. Nilson do Amaral Fanini, na Escola de Música Sacra no Seminário Teológico Batista em Louisville, Estado de Kentucky, EUA. Em maio de 1973 ele concluiu o Mestrado em Música Sacra com ênfase em piano e composição.
 
Em Louisville, ele conheceu sua esposa, Barbara Jones, que o ajudou no ministério de música na Igreja Batista de Walnut Street e subsequentemente passou dois anos em Recife como jovem missionária. Em janeiro de 1974, Isidoro retornou aos Estados Unidos para o seu casamento com Bárbara, celebrada na Primeira Igreja Batista de Winter Park, na Flórida, onde os pais da noiva residiam.

O ministério do ministro de música Isidoro começou na Primeira Igreja Batista de Niterói em julho de 1973. Após três anos ali, ele foi convidado a lecionar na Faculdade Teológica de São Paulo, servindo ao mesmo tempo como Ministro de Música da Igreja Batista Ebenezer. Percebendo, então, que precisava aprimorar-se mais para lecionar melhor numa escola de música sacra, ele regressou aos Estados Unidos em junho de 1976, para estudar no Seminário Teológico Batista Southwestern, em Fort Worth, Texas, onde, em 1980, concluiu o Mestrado em Música com concentração em Regência. 
 
No verão de 1985, o Dr. Isidoro recebeu o prêmio de Excelência Acadêmica ao terminar o grau de Doutorado em Artes Musicais nas áreas de Regência e Hinologia, defendendo a tese Os primórdios da hinódia das igrejas batistas brasileiras – suas fontes e desenvolvimento,4 que serviu como uma das fontes básicas na compilação deste livro. 

Regressando ao Brasil em agosto de 1985 com sua esposa Barbara e seus filhos Marcus, Matthew e Marisa, ele serviu como ministro de música na Primeira Igreja Batista de Niterói, RJ, e em 1988 na Igreja Batista de Itacuruçá, na Tijuca. Concomitantemente ele lecionou no Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil, exercendo a função de diretor interino do Departamento de Música por dois anos. No Seminário Batista de Niterói, coordenou o Curso de Música Sacra. Neste período ele participou de muitas clínicas e oficinas de música, como preletor e professor nas áreas de regência e culto e louvor, no Rio e na região. Também participou como relator da Subcomissão de textos do HCC por dois anos.

O Dr. Isidoro serve como ministro de música na Primeira Igreja Batista de Tuscawilla, em Winter Park, na grande Orlando, Estado de Flórida, onde teve o privilégio de implantar o ministério de música desta nova igreja, sendo o seu primeiro ministro. Durante os anos de 1993, 1994 e 1995 ele serviu como Diretor de Música na Associação Batista da Grande Orlando. 
 
Ele continua a ensinar os princípios bíblicos de culto e louvor, enfatizando que Deus merece somente o nosso melhor, e que o louvor agradável ao Senhor emana somente de um coração puro e daqueles que realmente conhecem a Deus e com ele se relacionam intimamente. Acredita muito no poder da música, no ensino de teologia e na memorização das escrituras. Por isso ele se dedica muito ao trabalho com vozes juvenis e coros graduados.

Além das teses de mestrado e doutorado, o Dr. Isidoro produziu várias composições, Lutas e vitórias – para conjunto vocal e instrumental, com textos do Dr. Olavo Feijó, e uma cantata para vozes juvenis  Emanuel, Deus Conosco publicada pela JUERP em 1980. Estas composições usam ritmos e estilos brasileiros. 
 
Ele também traduziu algumas obras corais e antemas para o português, introduzindo várias delas (Moteto para quarteto e coro de Michael Haydn e o Te Deum de Ralph Vaughan Williams) no Congresso da Associação dos Músicos Batistas do Brasil, em 1992, em Londrina, PR, quando foi convidado para reger o coro daquele conclave.
 


quinta-feira, 5 de maio de 2022

AINDA É TEMPO DE AGRADECER PELO HCC

Se eu tivesse o poder nas minhas mãos e voz, gostaria de ver todos os batistas brasileiros cantando os hinos do HCC – Hinário para o culto cristão, que já completou 30 anos. Não o tenho, mas quando canto algumas belas e profundas poesias, gostaria tanto que todos pudessem sentir a mesma emoção que enche minha alma quando entoo o hino 331 – Como um rio calmo – de Havergal, 1874/Mountain, 1876/ tradução Moreton, 1898.

Onde nós, batistas, estávamos que não conhecíamos este hino? Foi traduzido em 1878 e caminhamos 104 anos para que pudéssemos, como batistas, apreciar a poesia que diz que Deus traz a paz que satisfaz os crentes. Uma paz perfeita que cresce meiga e domina nossa vida trazendo a alegria. 

A metáfora linda que esse hino faz da paz que corre suave como um rio calmo me faz chorar de emoção. Quando estou aflita não tem como não ouvir dentro de mim e sai pelos meus lábios a poesia que diz – “Como um rio calmo vai correndo a paz”. E o meu coração se aquieta. Quero essa paz que flui do coração do Senhor como um rio calmo. “Ventos de cuidado, sombras de pesar nunca a santa calma poderão turbar”, diz a 2ª estrofe. Ah... não tenha medo, fique calma, os ventos que podem perturbar sua alma, tornar o rio bravio, perturbar sua paz, podem até vir, mas você está no abrigo da mão divina.

Cremos dessa forma, mas a poesia carregada pela linda melodia e harmonia faz com que confirmemos o que cremos. Eu sei que, firmada em Deus, terei bênção completa que é paz e comunhão. Sei porque experimentei. Sei é mais do que crer. Sei é ter caminhado com o dono da vida, do vento, da tempestade... Que bendita certeza de que, independentemente do que passarmos durante nossos dias – quer sejam alegres ou não – sempre o acharemos nos amparando.

Quantas palestras, sermões, livros falando sobre paz, mas quando cantamos esta poesia, que é o hino, ela fica gravada no cantinho da nossa mente e brota um sorriso leve dos nossos lábios que começam a cantarolar, pois sabemos que somos guiados pelos “raios derramados pelo sol de amor”.

 
1.Como um rio calmo, vai correndo a paz 
com que Deus aos crentes sempre satisfaz. 
É perfeita e cresce meiga em seu poder, 
alegrando a vida, dominando o ser. 

No Senhor firmado, tem o crente a paz, 
a completa bênção, comunhão veraz. 


2. No bendito abrigo da divina mão 
não há inimigo, não se vê traição. 
Ventos de cuidado, sombras de pesar 
nunca a santa calma poderão turbar. 

3. São os nossos dias, de prazer ou dor, 
raios derramados pelo sol de amor. 
Pondo a confiança plenamente em Deus, 
sempre o acharemos amparando os seus. 

Um amigo perguntou-me se achava que já deveríamos ter uma atualização com novos hinos no HCC. Então, respondi com uma pergunta, se já conhecia o hino acima ou o 77 do HCC (3ª estrofe) que diz assim: “com os enfermos vem estar, aos pobres vem alimentar; aos que no leito sofrem dor, dá teu alívio animador”. Ele ficou mudo e emocionado e encontrou resposta no seu coração.

Ainda é tempo de gratidão ao Senhor por inspirar tantos hinistas, poetas, tradutores, compositores e arranjadores. Ainda é tempo de agradecer ao Senhor pelo belo hinário que temos ainda desconhecido de muitos. Um dia todos se emocionarão, serão consolados e confortados quando encontrarem as belas poesias que estão dentro dele, podendo experimentar o Senhor do vento, do abrigo seguro e da paz.

Westh Ney Rodrigues Luz

 

sábado, 1 de janeiro de 2022

HCC 30 anos - Histórias dos hinos, 165

Hino 165. EM JESUS AMIGOS TEMOS
"Ninguém tem maior amor do que este, de dar alguém a sua vida pelos seus amigos. Vós sois meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando. Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu Senhor; mas chamei-vos amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos dei a conhecer" (João 15.13,14,15).

Há um ditado que diz:

“Um amigo verdadeiro é aquele que nos conhece muito bem, mas nos ama assim mesmo”.1

Um bom amigo nos aceita como somos, continua ao nosso lado tanto nos bons momentos como nos maus, está pronto a nos ajudar em tempo de necessidade e tristeza.

“Foi porque o autor deste hino, Joseph Scriven, achou um verdadeiro amigo em Jesus, que decidiu passar sua vida inteira mostrando real amizade a outros”.2

Joseph Medlicott Scriven (1819-1886) nasceu em Seapatrick, condado de Down, Irlanda, filho de um capitão da Marinha Real, e sobrinho dum pastor. Formou-se na célebre Faculdade Trinity de Dublin, capital. Possuía fortuna, educação, uma família que o amava e uma vida cheia de alegria. Estava prestes a casar-se com uma bela moça. Então, tragédia inesperada lhe sobreveio. Na noite anterior às suas almejadas núpcias, sua noiva afogou-se!

“Na sua tristeza profunda [e na melancolia que o perseguiria durante toda a sua vida], Joseph reconheceu que somente no seu amigo mais querido, Jesus, poderia achar o consolo e o sustento de que precisava.”3


Começara a carreira militar, mas sua saúde precária forçou-o a abandonar este sonho. Pouco tempo depois, Scriven decidiu emigrar para o Canadá. Mudou completamente o seu estilo de vida. Estabeleceu-se em Port Hope, orovíncia de Ontário, e propôs no seu coração que se dedicaria a ser amigo e auxílio aos outros. Professor por profissão, trabalhou, sem pagamento, para qualquer pessoa que precisasse dele. Doava sua própria roupa e outros pertences a qualquer pessoa necessitada. Tornou-se conhecido como “O bom samaritano de Port Hope”.

Uma vez um novo vizinho procurava quem lhe cortasse lenha. Vendo as ferramentas de Scriven, procurou se informar sobre ele.
- O senhor não pode empregar aquele homem, lhe disseram.
- É o senhor Scriven. Não cortará lenha para o senhor.
- Por que não? - perguntou o homem.
- Porque o senhor pode pagar. Ele somente corta lenha para viúvas e inválidos.4


Scriven sofreu outra perda devastadora. Noivo pela segunda vez, no Canadá, sua pretendida adoeceu gravemente, vindo a falecer. Ele também sofreu financeira e fisicamente. Com muita razão, Bill Ichter intitulou sua comovente história sobre a vida deste bom homem: Um homem marcado pela tragédia. 5
Foi ao ouvir da enfermidade da sua mãe em 1855, que Scriven, numa carta para ela, incluiu as comoventes palavras deste hino para o seu conforto, mensagem experimentada por ele dia após dia. Não pensou que outros fossem ver suas palavras. O hino foi publicado anonimamente. Até pouco tempo antes da sua morte, ninguém sabia deste dom poético de Scriven. Foi um vizinho, que foi ajudá-lo durante uma enfermidade, que viu a poesia, rabiscada num papel ao lado da sua cama.

“Lendo-a comovido, perguntou:
- Foi o irmão que escreveu isto?
- O Senhor e eu a escrevemos juntos, ele respondeu.”
6

Depois, Scriven publicou uma pequena edição dos seus poemas, Hymns and other verses (Hinos e outros versos), em 1869.
Scriven afogou-se num riacho pertinho da casa do seu vizinho amigo. Supõe-se que foi num delírio, porque continuava bem doente, e com muita febre. Estava debruçado, como se estivesse orando. Seus vizinhos de Bewdley e dos arredores, “erigiram três monumentos à memória desse humilde emigrante que veio da Irlanda e proporcionou tanta alegria a tantas pessoas”.7

A mensagem de conforto de Scriven tem alcançado os corações de milhões, porque é um dos hinos mais cantados ao redor do mundo. Depois de mais de um século, continua em grande demanda.8
O hino aparentemente apareceu anonimamente pela primeira vez em 1857, no hinário Spirit minstrel: A collection of hymns and music (Trovador espiritual: coleção de hinos e melodias), de J.B. Packard.


Habilmente traduzido pela operosa missionária pioneira Kate Stevens Crawford Taylor, nos primeiros anos do trabalho batista no Brasil, este hino tornou-se um dos mais cantados por evangélicos brasileiros. (Ver dados biográficos de Kate Taylor no HCC 112)
Sankey (ver HCC 112) e Bliss (ver HCC 117) estavam para publicar Gospel hymns n.1, (Hinos gospel n.1), em 1875. Depois de completar a coleção, Sankey, lendo um panfleto de hinos para a Escola Dominical, descobriu o hino de Scriven, ligado à melodia do seu amigo Charles D. Converse. Gostou muito. Achou que fosse do “Príncipe dos hinistas escoceses”, Horation Bonar (ver HCC 67). Desejoso que este hino estivesse nesse hinário, colocou-o no lugar de outro de Converse.  “Assim o último hino que entrou no hinário tornou-se um dos primeiros em preferência”.9

Mais tarde, Sankey soube, dos amigos de Scriven, de quem foi este hino tão importante.
Charles Crozat Converse (1832-1918) nasceu em Warren, Estado de Massachusetts e foi educado na Academia Elmira na cidade de Nova Iorque. Associou-se com William B. Bradbury (ver HCC 173) e Ira D. Sankey na compilação e edição de hinários para Escolas Dominicais, usando o pseudônimo Karl Reden, forma alemã do seu nome. Mais tarde, estudou música erudita no Conservatório de Leipzig, na Alemanha, onde conheceu Franz Liszt e Louis Spohr. Voltando aos Estados Unidos em 1859, estudou Direito na Universidade de Albany, Nova Iorque. Praticando a advocacia com muito sucesso em Erie, Estado de Pensilvânia, continuou como músico e escritor, interessando-se também em Filosofia e Filologia. Compôs melodias para hinos, quartetos mistos, antemas corais, cantatas e oratórios patrióticos, quartetos e outra música para cordas e duas sinfonias. A Faculdade Rutherford (Nova Iorque) lhe conferiu o Doutorado em Letras (honoris causa), em 1895. Converse faleceu em Highwood, Estado de Nova Jersey.
 

O nome da melodia, CONVERSE, homenageia este destacado compositor. Foi composta em 1868 e apareceu na sua coletânea Silver wings (Asas prateadas), em 1870 sob seu pseudônimo: Karl Reden.

Escrito por Edith Mulholand em Notas Históricas do HCC. Rio: JUERP_

__________________________________________
1. BARROWS, Cliff, ed. Crusade hymn stories. Chicago, IL: Hope Publishing Company, 1967. p.39.
2. OSBECK, Kenneth W. Amazing grace. Grand Rapids, MI: Kregel Publications, 1990. p.19.
3. Ibid.
4. SANKEY, Ira D. My life and the story of the gospel hymns. Philadelphia, PA: P. W. Zeigler Co. 1906. p.334.
5. ICHTER, Bill H.. Se os hinos falassem, v.1. Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista (JUERP). s/d. p.25.
6. SANKEY. Loc. cit.
7. ICHTER. Op, cit. p.28.
8. POSEGATE, Robert D. What a friend we have in Jesus. Em: HUSTAD, Donald P., ed. The worshiping church, Worship leader’s edition. Carol Stream, IL: Hope Publishing Company, 1990. n.622.
9. SANKEY. Op.cit. p.335.


HCC 30 anos - Histórias dos hinos, 327


327. SE TEU CORAÇÃO ESTIVER EM PAZ

"Tu conservarás em paz aquele cuja mente está firme em ti" (Isaías 26.3).


Este hino promete paz para a pessoa que está vivendo nas sombras das dificuldades, experimentando lutas, amargor, aflições e que sente que está passando por uma longa noite escura ou um forte temporal. A autora, Lizzie DeArmond (séc.19), pinta alguns quadros para mostrar o contraste da provação e o que o “coração em paz” pode experimentar mesmo nessa situação:

sombras e nuvens escuras? Há um arco-íris.
lutas, aflições? Há muitas bênçãos.
longa noite? Há aurora matinal.
temporal? Há céu mais brilhante.


Lizzie DeArmond,
que morava em Swarthmore, Estado de Pensilvânia, EUA, conhecia em sua própria experiência as verdades que ela escreveu. Sabia que nuvens podem escurecer a vida porque tinha encontrado muitas na sua vida, passado por muitos temporais e experimentado lutas e aflições. Tinha triunfado sobre suas dificuldades, porque ela sabia que a nuvem terá um arco-íris “se o coração estiver em paz”. Do laboratório da sua própria experiência, criou esta excelente fórmula espiritual para a cura de vidas atribuladas, “o coração em paz”.1


Bentley DeForest Ackley deu asas a este belo hino com sua melodia, e o hino foi apresentado durante as campanhas evangelísticas de Billy Sunday em Scranton, Estado de Pensilvânia, em 1913. A Sra. DeArmond teve o privilégio de ouvir as grandes congregações destas conferências cantar seu hino com muita alegria. O grande evangelista-publicador Homer Rodeheaver, com quem Ackley cooperou por muitos anos, publicou-o no mesmo ano. Um outro hino desta autora e Ackley, um arranjo para quarteto masculino, usado outrora nas igrejas, é “A oração de mamãe”.2 Elton Roth também musicou outro hino muito usado desta autora: Da senda o final.3


O tradutor do hino, o ilustre pastor e hinista Ricardo Pitrowsky, estava passando por duras provas. Descrevendo a ocasião em que este hino falou ao seu coração e ele o traduziu, disse:

No início do meu pastorado na Igreja Batista do Engenho de Dentro [de 1918 em diante] sofri ataques tremendos por agentes de Satanás com calúnias contra mim, com o propósito de forçar-me a demitir-me deste pastorado. Entretanto, como nenhuma das acusações pôde ser provada, fui fortificado pelo fato de que não havia nada na minha vida que pudesse quebrar a minha comunhão com Deus. Continuei firme no meu lugar através da paz que Deus proporcionou a meu coração. Esta experiência e uma outra semelhante que acontecera com o Dr. John W. Shepard, diretor do nosso Seminário no Rio, me incentivaram a traduzir este hino, que dediquei ao Dr. Shepard.4

(Ver mais dados biográficos deste hinista e incansável revisor do Cantor Cristão no HCC 114)
 

Bentley DeForest Ackley (1872-1958), irmão do hinista Alfred Henry Ackley (ver HCC 66), nasceu em Spring Hill, Estado de Pensilvânia. Ainda criança, aprendeu a tocar o melodeon (pequeno harmônio portátil), piano, clarinete e pífaro. Como Alfred, acompanhava seu pai em viagens de ensino musical, e tocava na sua banda de 14 componentes. Em 1888, Bentley foi a Nova Iorque estudar taquigrafia. Durante seus estudos, serviu como organista em igrejas daquela cidade. Em 1907, uniu-se com a equipe evangelística Billy Sunday-Homer Rodeheaver, viajando com eles como pianista e secretário, por oito anos.
Providenciava novos hinos para a congregação, coro e para solos. Mais tarde foi compositor e editor da Rodeheaver Publishing Company. Em 1930, Ackley encontrou-se com o ilustre pastor-missionário e hinista Oswald J. Smith (ver HCC 66). Colaboraram em mais de 100 gospel songs (ver HCC 112).

Ao longo dos anos, Ackley compôs mais de 3.000 melodias. Há mais de 30 delas nos hinários evangélicos do Brasil. O Hinário para o culto cristão inclui, além desta, as melodias dos hinos 338, 454 e 491. Em reconhecimento à contribuição deste dedicado músico à música sacra, a Universidade Bob Jones lhe conferiu o Doutorado em Música Sacra (honoris causa) em 1958, pouco tempo antes do seu falecimento. A Subcomissão de Música do HCC escolheu o nome CORAÇÃO EM PAZ para este hino de vitória, ecoando a mensagem central da letra. 

 Mulholand,Edith in Notas Históricas do HCC. Rio: JUERP

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1. SANVILLE, George W. Forty gospel hymn stories. Winona Lake, IN: The Rodeheaver-Hall Mack Co., 1945. p.82.
2. AZEVEDO, Elias Reis de. Comp. Louvores do coração, v.II, Santo André, SP: Casa Publicadora Brasileira, n.49.
3. Um outro quarteto masculino, do arranjo de Dario Pires de Araújo (ver HCC 291), Melodias de vitória, Santo André, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1955. n.204.
4. PITROWSKY, Ricardo. Incentivos de alguns dos hinos que escrevi, monografia inédita, Em: PAULA, Isidoro Lessa de. Early hymnody in brazilian Baptist churches: Its sources and development. Fort Worth, TX: School of Church Music, Southwestern Baptist Theological Seminary, 1985. p.175.

 

sexta-feira, 12 de novembro de 2021

A MÚSICA E O MÚSICO BATISTA NOS 150 ANOS DA DENOMINAÇÃO NO BRASIL

 Westh Ney Rodrigues Luz, set|2021


“A palavra de Cristo habite em vós ricamente, em toda a sabedoria; ensinai-vos e admoestai-vos uns aos outros, com salmos, hinos e cânticos espirituais, louvando a Deus com gratidão em vossos corações.” (Colossenses 3.16).


                 Quando os irmãos americanos chegaram em Santa Bárbara do Oeste, SP, trouxeram a fé e também sua arte e cultura. Há referência nos documentos citados pela historiadora Betty Antunes de Oliveira de três pianos, sendo um de mesa além de um harmônio portátil e inclusive um curso de piano por correspondência. Talvez cantassem em coro, pois inclusive pediram que lhes fossem enviados hinários com música. Entre os hinários, há um destaque para um com partituras para três e quatro vozes separadas. Com eles trouxeram suas canções de fé, folclóricas, infantis, de amor etc.


              Posteriormente recebemos missionários desejosos de ganharem a pátria para Cristo e de fortalecer a fé nos corações, além de conforto e esperança. Começaram a construir uma hinódia com traduções, versões e poesias que se tornaram hinos. Proliferaram quartetos, trios, solos, coros pelo país nos centros por onde passaram nossos missionários pioneiros, com seus harmônios portáteis.


             Nosso primeiro hinário foi o Cantor Cristão, e que está fazendo 130 anos (2021) e com 37 edições (581 hinos). A 1ª edição surgiu em 1891 com apenas 16 hinos compilados por Salomão Ginsburg. 


           Com a criação dos Seminários Teológicos Batistas do Norte (1960), do Sul (1963) e Equatorial (1990), surgem o preparo aos vocacionados músicos com curso livre preparando pessoas para servirem às igrejas batistas e outras denominações protestantes, exercendo o ministério de música nas igrejas. Em cerca de 60 anos de ensino, nossos seminários já entregaram centenas de formandos que estão no país e no mundo servindo por meio da ferramenta música com práticas pedagógico-musicais nas igrejas, ensinando em projetos sociais e em escolas livres de música. Atualmente, com o credenciamento do STBNB e STBSB junto ao MEC, é ampliado o leque da atuação dos músicos cristãos, batistas e vocacionados lecionando e testemunhando em escolas.


            Foi organizada a AMBB – Associação dos Músicos Batistas do Brasil (1982), que deu continuidade às clínicas e seminários de música nas igrejas, realizados pelos nossos pioneiros músicos, missionários, professores e alunos dos seminários. Há também, associações regionais que cumprem o mesmo papel dando assistência mais direta ao músico. Temos centenas de coros pelo país e muitas orquestras e bandas. Em 1984, foi criado o documento “Fundamentos filosóficos e bíblicos para a música sacra” e as bases da construção para um novo hinário que foi lançado em 1991 – Hinário para o Culto Cristão (HCC) com 611 hinos.  


           Hoje temos presenciado músicos e compositores maduros, conscientes da missão de equilibrar cânticos, hinos e salmos para a edificação da igreja de Cristo no tempo que se chama hoje.

*Texto para a *Revista Batistas SP* por ocasião dos 150 anos dos Batistas no Brasil, a pedido de Tânia Kammer.





quarta-feira, 14 de julho de 2021

MARÍLIA SOREN


 (Rio, RJ | 4 de outubro de 1935 - 28 de março de 2007)

“Me chama só de Marilia! Nada de dona, senhora, professora...” dizia e sorria amorosamente com seus olhos azuis e vívidos que logo conquistavam a afeição daqueles que tinham o privilégio de serem envolvidos por sua naturalidade, simplicidade e ao mesmo tempo por tanta sensibilidade musical e riqueza artística.   

Marilia de Miranda Filson Soren nasceu em 4 de outubro de 1935, no Rio de Janeiro.  Filha do Pastor Dr. João Filson Soren e da professora e organista Nicéa Miranda Soren, foi batizada na Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro, em 25 de maio de 1947, pelo próprio pai.

Muito cedo demonstrou suas aptidões musicais, pois com apenas quatro anos de idade executava pequenas peças pianisticas, não demorando muito a cantar acompanhando-se ao piano e a reger na igreja coros infantis na Escola Dominical.

Diplomou-se com distinção pelo Conservatório Brasileiro de Música, tendo sido escolhida para ser a oradora da turma de formandos, em solenidade no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, em 1955. Recebeu o título “Estudante do Ano” no setor musical, uma promoção do “Diário de Notícias”

Fez seus cursos superiores de piano, canto, órgão, regência e arte lírica no Conservatório Brasileiro de Música, Escola de Música Villa-Lobos, Escola de Arte Lírica do Theatro Municipal e Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro; realizando mais tarde cursos de aperfeiçoamento e Pós-Graduação em Canto com os mestres: Giuseppe Croce, Leda Coelho de Freitas, André Vivante, Alda Pereira Pinto, Consuelo Savastano, Otello Borgonovo, Zsolt Bende, Stani Zawadzka.

“Marilia Soren foi uma das musicistas que se destacaram na música evangélica nos últimos 50 anos; poucas tiveram tão extensa e duradoura folha de serviços, nas igrejas e no meio artístico, como intérprete ou executante de páginas da literatura operística e de peças da música instrumental, bem como na regência de obras da música coral.” Rolando de Nassau, artigo: Tributo a Marilia Soren, O Jornal Batista, 3/06/07.

As primeiras referências relativas à participação no “Culto do Senhor” da musicista Marilia Soren, são datadas na Semana Santa de 1954 quando cantou a parte solista do “Messias” de Haendel e também executou ao órgão uma Toccata e Fuga de J. S. Bach.  O Coro da Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro, naquela época sob a regência de Natanael Mesquita, contava com 109 coristas e era considerado o maior e melhor coro de igreja evangélica do Brasil. Em 1958,  Marilia viria assumir a regência deste coro, desenvolvendo um intenso trabalho por um período de 9 anos. Cultos cantados, integração com instrumentistas e coros de igrejas irmãs, solenidades e apresentações na rádio e televisão proporcionaram a propagação da música coral sacra que se expandiu incluso o ambiente musical secular.  

 

 

Foto 2 – Coro Eclésia da PIBRJ, regente Marilia Soren, apresentando-se na TV TUPI cantando um programa sacro no Show da Noite, em 1966)

Em uma época com dificuldades para a aquisição de repertório sacro na língua pátria, Marilia dedicou-se a tradução de diversos hinos, solos, duetos e peças corais provenientes de cantatas, missas e oratórios. Catalogou, traduziu e adaptou diversos discantus que eram entoados pelo coro juntamente com o cântico dos hinos pela congregação. Várias dessas obras fazem parte até hoje do repertório estável do Coro Eclésia da PIBRJ e demais coros.                                                                                                

Com apenas 24 anos foi vencedora do concurso de canto em âmbito nacional para solistas da Orquestra Sinfônica Brasileira. Esse prêmio lhe valeu, além de um concerto com a orquestra transmitido ao vivo radiofonicamente do Theatro Municipal, a gravação de um disco. Posteriormente apresentou-se na rádio MEC, cantando um “Recital Haendel”, no programa “Jovens Recitalistas Brasileiros”. 

Vencedora de oito concursos nacionais de canto, Marilia Soren foi solista das mais destacadas orquestras:  Orquestra Sinfônica Brasileira, Orquestra Sinfônica Nacional, Orquestra de Câmara da Rádio MEC, Orquestra Petrobrás Sinfônica, entre outras.  Participou durante 10 anos como pianista, organista e cantora solista colaborando as atividades da Associação Coral Evangélica, atuando ao lado dos regentes Heitor Argolo e Saulo Velasco, da soprano Glaucia Simas, em concertos e gravações que foram recebidos elogiosamente pela crítica musical especializada.  Como cantora solista do elenco do Theatro Municipal do Rio de Janeiro participou das produções operísticas nas temporadas de 1960 à 1962. Prosseguindo sua carreira lírica foi frequentemente requisitada para cantar Santuzza, personagem principal da ópera “Cavalleria Rusticana”, em diversos teatros brasileiros. Marilia obteve grande sucesso como intérprete da ópera “Condor”, do compositor brasileiro Carlos Gomes, nas Vesperais Líricas do Theatro Municipal de São Paulo, em 1982. Apresentou-se por uma última vez em óperas cantando a personagem da Princesa de Bouillon, na série Ópera do Meio-Dia, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, no ano de 2000.  Foi uma conceituada recitalista de música erudita e sacra, tendo sido convidada para atuar na TV Tupi, nos “Concertos para a Juventude” da TV Globo e em cantatas e oratórios na Sala Cecilia Meirelles.

 

 

Foto 3 – Marilia Soren, mezzosoprano, como protagonista da ópera Sansão e Dalila“ de Camille Saint-Saëns, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 1960.  
 Foto © Arquivo Soren




Estudou com o eminente organista Antônio Silva, professor catedrático da Escola de Música da UFRJ, realizando posteriormente na mesma instituição Curso de Alta Interpretação Organística ministrado pela renomada Gertrud Mersiovsky.

Marilia foi organista do concerto inaugural dos seguintes órgãos: Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro  (órgãos Hammond e Rigatto), Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil,  Igreja Presbiteriana de Madureira,  Colégio Santos Anjos em Vassouras, Capela do IGASE do Rio de Janeiro, Igreja Presbiteriana da Taquara, Quarta Igreja Batista do Rio de Janeiro, Igreja Evangélica Luterana do Rio de Janeiro, Igreja Anglicana do Redentor e reinaugurou os órgãos de tubos das igrejas luteranas de Juiz de Fora (MG) e de Petrópolis (RJ). Participou também, em 1955, como pianista no concerto de inauguração do grande piano de cauda Petrov da Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro.   

 

 

 

Foto 4 – Organista Marilia Soren durante um concerto ao grande órgão Tamburini da Escola de Música da UFRJ, em 1985. © Arquivo Soren 

 

 

 

 

   

 

Marília dedicou-se aos seguintes encargos como organista e regente: Organista e Regente Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro (Coro João Soren e Coro da Igreja, hoje denominado Eclésia), Organista da Associação Coral Evangélica, Organista da Sociedade Excelsior de Arte e Cultura, Organista do Serviço de Rádio e Gravações da Casa Publicadora Batista, Organista Oficial do 10°. Congresso Internacional da Aliança Batista Mundial, Organista Concertista da Associação Brasileira de Arte e Cultura Artística de Petrópolis, Organista Concertista dos Festivais de Inverno de Ouro Preto (MG), Organista e Regente do Coro do Hospital da Aeronáutica, Organista da Igreja Presbiteriana da Usina e Organista e Regente Titular da Paróquia do Redentor – Igreja Episcopal Anglicana. Atualmente esse coro denomina-se Coro Marília Soren, prestando homenagem à memória de sua regente que atuou por 36 anos. 

 

  Foto5 - Coro Marilia Soren. Ela foi regente por 36 anos na Paróquia do Redentor - Igreja Episcopal Anglicana do Rio de Janeiro. Foto © Arquivo Soren


 
 
 
 

 

Foto 6 - Marilia Soren foi a organista no 10 °. Congresso da Aliança Batista Mundial, no Maracanã, em 1960.   Foto © Arquivo Soren

 

 

 

 

 

 

 

Recebeu o título “Melhor Organista do Ano”, em 1958 e 1959 consecutivamente, conferido pela “Crítica Musical do Jornal Batista” por suas atuações na denominação e em concertos públicos. Em 1960 foi distinguida como “a melhor amiga da Música Sacra”, não somente pela meticulosa escolha e execução de seu repertório litúrgico nos cultos da PIBRJ, como também pelo concerto inaugural do órgão Hammond do Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil.

Exerceu durante vários anos o magistério da Música, do nível básico ao superior, tendo sido convidada a proferir ciclos de conferências ilustradas sobre História da Música Brasileira e História da Ópera pela Secretaria de Assuntos Culturais do Ministério de Educação e Cultura. Lecionou no memorável 1º Instituto de Música Sacra, idealizado e organizado por Bill Ichter, em Recife, em 1964.  

 


Foto 7 - Corpo docente do 1º. Instituto de Música Sacra. Info: https://www.pastorjoaosoren.com/bill-ichter - Professoras Katherine Smith, Marilia Soren, Noemi Gonçalves e Elza Lakschevitz. Professores Fred Spann, Bill Ichter e Gamaliel Perruci.  O Prof. Davi Mein, ausente na foto, lecionou "A Música na Bíblia". Recife, 16 a 21 de março de 1964.  Foto © Arquivo Soren

 


Marilia Soren participou como cantora, pianista, organista e regente em cultos, ofícios religiosos, concertos, gravações, congressos e festivais de música em incontáveis atuações por todo o Brasil. Na Europa cantou em Madri, Roma e Bérgamo, atuando como organista em diversas igrejas e salas de concerto.  

Orientou com valiosos conselhos técnicos e conhecimento de repertório sacro a formação e ampliação instrumental do “Aulos”, conjunto de repertório sacro renascentista e barroco, atuante entre 1975 e 1990, que foi o impulso originário para a futura organização da Orquestra da Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro.

Estava sempre pronta para cooperar.  Irradiando felicidade cantava, tocava, ensinava e trabalhava técnica vocal com solistas e coristas, contribuindo desta forma no processo de solidificação e formação de novos coros evangélicos, fato até hoje saudosamente por muitos testemunhado.

Foi agraciada, entre outros títulos, com a Medalha de Confraternização da Confratex, por relevantes atividades exercidas em setores da música erudita, sacra, brasileira e cívica.                              

 
 Tomou posse em 1998 como catedrática da Academia Internacional de Música, com o Grau de Conselheira. Foto © Arquivo Soren, 2005

Marilia teve dois filhos os quais muito amou e se dedicou. Suray Sosa Soren, violinista da Orquestra do Theatro Municipal do Rio de Janeiro e professora pioneira no Brasil do método de violino Suzuki Tropical para crianças. Amaru Sosa Soren, radicado atualmente na Alemanha, professor em Universidades na Europa, organista e maestro titular do Coro da Rádio Berlin-Brandenburg. Foi abençoada com três netos: William, Stephanie e Richard.

Quando cantava com sua voz de mezzosoprano, Marilia era fervorosa e ungida, possuía um timbre nobre, volumoso, emocionando sempre.  Ao órgão, além de executar obras dos grandes mestres, era capaz de improvisar em estilo clássico/sacro, não necessitando de partitura para acompanhar os hinos congregacionais, criava então modulações e cadências próprias para cada momento do culto. Foi uma regente muito amada e respeitada, pois conquistava logo a atenção de seus coristas através da forma contagiante pela qual transmitia a música divina que sentia.

Marilia Soren influenciou gerações de músicos hoje ministros de música, organistas, cantores, coristas, instrumentistas, educadores; passando adiante seus conhecimentos e estimulando-os sempre com palavras de encorajamento e fé cristã.  Chamava todos pelo nome e em seguida acrescentava “flor! menina! broto! garoto!” carinhosamente.

Em 2008 foi concebida a “Medalha Marilia Soren”, uma iniciativa de Jaime Hilário, diretor do programa de rádio “Encontro Coral”, com a finalidade de condecorar os dez músicos de maior destaque no ambiente musical evangélico do ano corrente.

Em seus últimos dias de vida terrena, quando devido a sua enfermidade, ela já não tinha mais forças para se levantar, mesmo com dores, pedia para ser levada até ao piano e tocava alguns hinos. Entre eles “A Cidade Santa”. E dizia então “me foram enviados por Deus esta noite...”.

Uma vida servindo a Deus, uma inspiração, um exemplo. Desde 1954, quando a jovem Marilia Soren pela primeira vez ofereceu seus dons no culto do Senhor, sempre de coração vibrante, sempre com reverência e humildade, até janeiro de 2007. Poucos meses depois ela foi chamada para estar na presença de nosso Deus. Foram 53 anos de dedicação de seus talentos ao altar do Senhor.

 “Entrega o teu caminho ao Senhor, confia nele e Ele tudo fará”  Salmo 37.5 - versículo bíblico que Marilia Soren escolheu para acompanhar a sua vida.

 Amaru Sosa Soren, seu filho – radicado atualmente na Alemanha, professor em Universidades na Europa, organista e maestro titular do Coro da Rádio Berlin-Brandenburg.

Publicação original e inédita cedida para Westh Ney Rodrigues Luz, para uso neste blog - Blogdawesth 

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Meu depoimento pessoal: 

 

 Biografia de uma mulher incrível. Talentosa, humilde, sorriso amplo e de uma dedicação sem limites aos amigos, família, igreja, música coral, órgão, ópera... Com seu sorriso amplo alcançava e abraçava todos. Nós nos amávamos. Postar sua história, enviada com exclusividade pelo único irmão que tenho e assim mesmo, não é de sangue - Amaru Soren me traz uma alegria de saber que temos sempre com quem contar na caminhada terrena. Nossos caminhos estão ligados há mais de 45 anos.(com toda a família). 


Com pastor Soren, PIB do Rio tem cerca de 60 anos. Laços de amizade são presentes de Deus para nós humanos, se assim nos permitimos. Minha casa tem o perfume, alguns livros, hinários, bijouterias, enfeites da Marília... tem crochés e bordados da D. Nicéia, sua mãe. Cada vez que coloco um deles na minha mesa o coração fica carregado de lembranças alegres e memoráveis. Algumas lembranças ficarão guardadas no coração em silêncio e nunca serão relatadas. Não interessa. Tem coisas que são importantes só para quem as viveu.


Lembrar do Pr. Soren ouvindo minhas indagações na sala iluminada por um abajour e respondendo calmamente depois de alguns minutos de silêncio... é de lavar a alma. Com ele tirei muitas dúvidas na organização do HCC em termos e classificações teológicas há 30 anos. Aliás, todos sentiam alegria e davam muitas opiniões sobre o HCC. Marília me deu hinários Luteranos, outros alternativos...
As sopas na mesa redonda da sala de jantar, a torta de morango, o sorriso comedido da D. Nicéia. Ela era mais moderna e contemporânea do que os jovens naquela mesa de refeição cheios de conceitos e questões fechadas. Ela não. 


Quando Marília chegava a casa inundava de sons e gargalhadas... Seu amor pelas pessoas se refletia no perdão e na compaixão que tinha por todos.
Olhando essa foto que abre o blog, vejo os traços fortes e a marca do sorriso na Suray e no Amaru, seus filhos. Está presente neles, a bondade e animação principalmente da  Suray Soren . Ai que saudades de todos!


É gente... a vida é pra ser vivida junto com as pessoas que amamos e que mesmo partindo para a eternidade deixam suas marcas em nós.


 Westh Ney Rodrigues Luz